segunda-feira, 14 de março de 2011

Relatos de Anny - III

Hoje meus pais vieram me visitar. Disseram que eu estava muito pálida. Mas são neuras de genitores. Minha mãe ao entrar perguntou se alguém tinha me visitado em casa, porque ela notou que dois copos estavam sujos ao invés de um. Pra mentir eu disse que sim. Mas mal ela sabe que, quando sozinha, preparo uma mesa, coloco dois copos, encho os dois, e como mulher tenho um fígado frágil me embebedo e esqueço por um segundo que já encontrei o amor da minha vida. Ela agora se dirige a sacada, fica alí por um instante e volta pra dentro, agora vidrada em meu pai, que sentado, lia o jornal que tinham acabado de jogar em minha porta. Por um segundo não entendi porque o interesse de minha mãe. mas ao ler a manchete da primeira folha, soube. A cidade que antes morávamos, quando ainda vivíamos sob o mesmo teto, estava alagada. Na imagem, destroços do que denominamos ser o antigo parque, onde tantas vezes me tiraram aos berros por querer permanecer naquele mundo tão colorido. Ambos nos tomamos de lembranças, mas por momentos. Como em todos os momentos da minha vida, algum som ou ato atrapalhava a monotonia do silêncio. Não era campainha, telefone ou algo assim, mas Lola, minha cachorra. Que latia, como que querendo nos persuadir a segui-la. Mas não seguimos. Ao contrário, ainda imóveis, agora sorríamos. Estavamos longe do perigo, tanto em data como em quilômetros, e isso era o que importava. Também se encontrava longe nosso ânimo em nos comunicarmos, então meus pais saíram. Disseram um tchal e pediram para que me cuidasse. Agradeci a preocupação e os desejei o mesmo, e completei com a famosa anedota, dizendo lhes que não tinham mais idade pra bagunçar, mas que bagunçassem. Rimos. Em torno de um minuto foram embora, e novamente voltei a minha mesa, sozinha à dois. Olhei para o relógio, eram 20:00 horas. A hora era como se fosse um dispositivo que disparasse minha memória, então me dei conta que ele iria vir em casa hoje, recém curado de sua vergonha. O dvd estava carregado, a pipoca comprada, o edredom dobrado sobre o sofá. Mas em mim, nada estava respeitando os horários. Então parei de pensar,    e fui preparar-me. Eu iria vê-lo, e isso basta para que me preocupe com minha auto-estima. Depois de pronta, me sentei no sofá, esperando que a campainha tocasse. O vento soprava lá fora, mas haveria frio por pouco tempo.

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