terça-feira, 20 de março de 2012

A embriaguez cotidiana

A vida é como o efeito do álcool no organismo. Primeiro tudo é novo e atraente. Sorrimos e nos familiarizamos. É tudo fácil e o que precisamos fazer é seguir a música, nem ritmo nos exigem. Os passos, às vezes curtos, outras tantas longos, podem nos levar a qualquer direção que tudo será ainda alegria. A falta de responsabilidade embriaga o homem assim como a bebida. Mas então, o segundo estágio começa a acontecer. Quando vamos tentar caminhar sozinhos como vínhamos fazendo, nossos pés não reagem. Sentimos-nos perdidos e às vezes caímos e nem nos conseguimos levantar. O mundo novo e já crescido é como a visão turva de um suposto degrau para um embriagado. No chão, o terceiro e decisivo estágio acontece. Mãos se estendem e você tenta se agarrar a elas em busca de se levantar. É a única chance que temos de não amanhecer na calçada. Tentamos mais e mais agarrar aquelas mãos que, se pegas a tempo, nos abrirão portas. As oportunidades que se apontam quando nos sentimos perdidos são como as mãos estendidas aos bêbados caídos. O quarto estágio é calmo, se agarramos alguma mão que nos levou para um ponto confortável. Outras tantas vezes inquieto, se as perdemos e fizemos dos degraus nossos eternos obstáculos. É o estágio onde alguns desfrutam, produzem e descansam, enquanto outros procuram, se perdem e se cansam. A estabilidade moral, financeira e física ou sua ausência, é como a cama para o que se levantou ou a calçada para o que não teve o mesmo fim. O quinto e último estágio é talvez o mais compensador. Não importa se sorrimos ou choramos nos demais, neste tudo é passado e esquecimento. Tudo o que fomos nos cai como inatingível, esquecido. Vem para nos fazer esquecer de tudo o que um dia almejávamos ou tivemos. Tranqüiliza a mente e a prepara para um depois ainda imprevisto, sem contornos definidos. O que resta é só uma cabeça que dói, talvez por ter visto tudo ter passado rápido demais ou não ter visto coisa alguma. E então, a velhice vem para nos fazer esquecer de tudo o que fizemos, assim como a ressaca vem e, em troca de tudo, deixa somente a dor para mostrar que tudo o que ele não lembra aconteceu. Esta é a vida que enturva nossa visão cada vez que nos deparamos com novos obstáculos.

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